Durante uma reunião ocorrida entre os organizadores da festa outro dia, após a missa dominical, alguém falou: "Beto você vai fazer o cartaz da festa para nós. Não vai?" Passei as mãos na minha "vasta cabeleira" simulando dúvida, depois balancei a cabeça positivamente, sinalizando que topava. Afinal todos nós da comunidade precisamos, por obrigação, de alguma forma colaborar com a igreja.
Cartaz da tradicional Festa Fluvial em Iporanga que acontece entre o final do ano e inicio do outro(Para ver o cartaz ampliado clique duas vezes no meio da imagem).
A 29 de dezembro chegamos a Yporanga. É uma localidade que pode chegar a ser alguma coisa, se as minas de chumbo e outros mineraes forem explorados. Desgraçadamente não o são. Depois de tres dias de um diluvio de Noé, montamos os nossos cavalos e fomos até a mina de chumbo. É um morro completo; não há mesmo picadas: passar a noite ahi n'esta estação é morrer, e as explorações que fizemos foram ligeiras.
A 2 de Janeiro do corrente anno, deixamos Yporanga, com os auxilios prestados pelo snr. vigario da parochia, rev. padre Antonio da Silva Pereira."
Podemos observar que durante os três dias em que sempre aconteceram as festas, e até com relação ao diluvio de Noé, que sempre esteve presente nestas ocasiões, tudo confere com os dados atuais, porém em momento algum foi mensionado a festa de N.S. do Livramento, embora Francis Burton estivesse auxiliado e acompanhado do páraco, que sem dúvida seria o maior envolvido com os festejos religiosos. Donde se conclui que naquela data a festa ainda não existia.
Outro dia, eu e a Nicinha, colega do departamento, mandamos uma cópia do cartaz da festa em PDF para o professor aposentado Avelino que, em outros tempos, deu aula em Iporanga, e que atualmente vive e trabalha em Avaré. Ele, como resposta mandou-nos os belos versos que transcrevemos abaixo:
Mergulhos na Passagem
Uma escadaria, duas garotinhas, um prédio
O pedestal, duas estátuas, a moldura
Tudo cristalizado, nesta mente perdura
De um revoar bem diferente o início.
Uma rua, a beleza de estonteante morena
Mocinha, que descalça, desce a ladeira
Lá embaixo, o aconchego da bela pracinha
Fronte a igreja de taipa, pequena
O coreto, flores, relva, bancos de madeira
Suor, muito suor, meu Deus , que calor!
Um mergulho nas águas do Iporanga, na passagem
Existe coisa melhor? Em tão bela paisagem
O corpo refrescar e o "candango" espírito acalmar?
Fim de ano, que beleza! Na natureza
Barcos descem o grande Rio Ribeira
Trazendo toda a realeza da Santa Padroeira
De pedra, o muro, um porto seguro
Para a Santa desembarcar
Com Fé, o povo a conduz ao altar.
Prof. Avelino Fernando Menck
Conversando com o ex-prefeito José Carlos Barbosa outro dia em Apiaí, cidade irmã que está situada bem no alto da serra a alguns poucos quilometros de Iporanga, perguntei-lhe se iria comparecer em nossa cidade para assitir a festa de N. S. do Livramento. Ele respondeu que sim porque seu plano era seguir viagem para Coritiba, onde tem uma residência, e que iria via Iporanga e Régis Bitencourt, para ver a nossa festa. No meio da conversa surgiu a história da Varação de Canoas que ele promoveu na lavração de canoas para compor a estrutura da balsa, e falamos também sobre o documentário rudimentar feito, sobre o evento, naquela época em videocassete. Comentei também que o Carlinhos filho da Dona Aurica e do saudoso Sr. Nelsom Ramos(Locade), pretendia fazer uma canoa grande e depois descer com ela montada na estrutura da balsa. Imediatamente o Zé Carlos acudiu dizendo:
Nas três fotos estão imagens da Varação promovida pelo Carlinhos; na primeira foto ele aparece a esquerda da canoa na frente do mestre canoeiro Gentil Cabeção; que aparece só em outra foto, vemos também na terceira foto, o padre Joca de camiseta amarela e o Carlinhos ao fundo dentro da canoa olhando o padre que almoçava o prato caprichado, feito pelo João Batista e a Dona Marina esposa do Gentil, que é cantora oficial dentro da balsa e que faz a comida dos construtores da balsa no dia 31 de janeiro, também ajudou neste prato do pessoal da Varação a Janete esposa do Carlinhos. Na frente do padre, vemos o mestre canoeiro Satuca, com camisa escura, alinhado com o João Batista (filho do mestre balseiro Dito Guache; João aparece sem camisa ao fundo).
Dois dias depois, conversando com o prefeito Gulu a tarde na porta da prefeitura ao lado da copa, e do delicioso café da Eliana, embaixo do toldo, pois o sol estava de rachar, comentei sobre a canoa do Carlinhos que era muito grande, e que o próprio Carlinhos me afirmou ser aquela, a maior de todas, e que o sábado seria o Dia da Varação para tirar a canoa, e fazer o acabamento final. Rapidamente fui interrompido pelo Gulu, que fez um reparo na conversa dizendo:
- " A conoa do Carlinhos não é a maior, ela é igual a minha, que também vai descer compondo a montagem da balsa"
Depois logo em seguida o prefeito desceu em sua pickup para resolver um problema, provavelmente na casa da agricultura, e assim que ele saiu, chegou o Carlinhos, e assim que ele colocou o primeiro pé na calçada da prefeitura eu comentei sobre a conversa, que ali havia acabado de acontecer, sobre o tamanho das canoas. Diante do que foi exposto ele retrucou dizendo:
"-Não senhor! A minha canoa é quatro dedos maior do que a do Gulu".
No dia seguinte, o Carlinhos me disse que encontrou o Gulu e que; em tom de brincadeira afirmou e garantiu, para o prefeito que a conoa dele, Carlinhos; era quatro dedos maior que a do chefe do município. Resumindo o Gulu resolveu comprar a tal canoa com seu título de campeã, e superar a desvantagem, negócio que o Carlinhos topava, e já ia começar a procurar outro Guaraqui ou Ariribá para substituir o canoão, enquanto o Gulu passava a ostentar o título de dono da maior canoa feita em Iporanga. O sábado acordou com uma alvorada de fógos, e além do Carlinhos foram todos os caiçaras da cidade e mais os da Ribeira acima e até o padre Joca, Missionário do Verbo Divino, nascido em Iporanga e resgatando a nossa cultura, fazendo a Varação e trazendo a canoa numa aventura cheia de história
Antigamente quando cada festa da milagrosa era dirigida por um cidadão ilustre e abastado, havia sempre disputa e comparação sobre o desempenho de cada festeiro, a beleza e a pirotecnia de cada festa. Eu me lembro que a festa em que o Sr. José Eliseu era o festeiro, nos anos 50, por longo tempo foi considerada a mais bela, embora nunca tivesse disputado uma eleição, também no ano de 51, ele concluiu a sua obra principal, a nova igreja de São Benedito, que substituia a antiga, já destruída, que se localizava próximo ao largo do Rosário, até que surgiu a festa e a fase do Sr. Jeremias em 1961.
As festas de Nossa Senhora com sua balsa, e as do Divino com a Coroação do Império, onde o festeiro que fazia o papel de imperador e recebia a coroa, e ou o que realizava uma boa festa de N. S. do Livramento, sinalizavam sempre para a vaga de futuro prefeito. Na Igreja, quando dominava a política, em tempos remotos, existia uma hierarquia, onde o político começava ainda criança ostentando a faixa amarela da Cruzada Infantil sem nenhuma divisa até chegar à terceira divisa, depois a faixa azul do Congregado Mariano e a faixa vermelha do Apostolado do Coração de Jesus e a faixa roxa da Irmandade das Almas, todos com seus hinos, e ainda antes de ser Imperador o político tinha que galgar uma das quatro vagas para carregar o Pálio ( toldo que cobria o sacerdote com o Santíssimo durante a passagem Deste por ruas da cidade, ou na procissão) e por último o estandarte da congregação( Haviam atribuições, como carregar a cruz da procissão, que era ocupada pelo Sr. Joaquim Ursulino, que depois foi passada para o Sr. José Rola; a tarefa de bater os sinos, Celso Cabeça; monitor da igreja, Dona maria Adriana), graduações que junto com uma boa festa, serviam também como trampolim político na disputa da cadeira de prefeito. Havia o costume de se dizer que: quem fazia uma grande festa, ou recebia a Coroa do Divino, se elegia prefeito no próximo pleito.
Por isso acho muito interessante frisar a sequência de prodígios realizados pelo Sr. Jeremias, antes de sua primeira batalhas nas urnas, que nem mesmo todo o carisma, e o apoio velado do governador Ademar de Barros ao Senhor João Alves Cavalcanti conseguiu quebrar. Entre as façanhas está um documentário feito em um filme que ele mandou produzir por profissionais especializados, no início da década de 60. Nesta preciosa relíquia, já um pouco prejudicada por danos causados, pelo descuido e até pela própria ação do tempo. Esta obra nos permite resgatar a memória de momentos e personagens muito importantes para nossa história. Havia também um outro filme, este foi patrocinado em 1938, pelo então prefeito Sr. Pedro Caetano dos Santos e dirigido por Chateaubriand, do qual espero que tenha ficado alguma cópia no acervo da Fundação de mesmo nome, pois a cópia que existia em Iporanga foi distruída, a algum tempo, por ação de jovens ladrões vândalos, que invadiram a residência do Sr. Pedro Caetano com objetivo de furtar objetos de valor para trocar por droga, ocasião em que destruiram, entre outros documentos históricos, aquele filme, que mostrava um momento de Iporanga, tão importante e que talvez esteja perdido para sempre. Portanto: acho importante os registros, que nos restam, feitos no filme do Sr. Jeremias, uma iniciativa cultural demonstrada por poucos prefeitos, onde podemos ver aquele momento do prefeito e de outras pessoas queridas, como o celebrante Padre Oscar dos Santos, e o saudoso Sr Manoel Corimba pai, fazendo leilão e tocando clarineta, na banda Lira Iporanguense, além do Ito com o cabelo e bigode pretos, idem o Essanão, o Alcino dias, os saudosos Basilião, Tico França, Nascimento Sátiro da Silva e outros, além de antigos logradouros como a praça da Matriz, o porto do Ribeirão, a rua Funda, também a rua De Baixo e muito mais, tudo mostrado na reprodução abaixo:
Impossível ficar calado diante de tantas lembranças de nossa querida Iporanga.
ResponderExcluirBeto, apenas ontem fiquei sabendo desse blog e stou me deliciando com as histórias.
E aí nos damos conta de nossas origens, revendo histórias de meus Tataravós, Bisavós, Avós e Tios, tanto por parte de minha Mãe (Pedro Caetano e Nhá Zinha)e de meu Pai (Antero e Nhá Lica).
Lembrar do Padre Caiaffa. Ainda faltam o Padres Solano e João Desidério, né?...Também fui coroinha nessa Igreja, aos 5 anos de idade, respondendo no missal em Latim, e tropeçando na batina carinhosamente preparada por Dona Maria Adriana...
Que bom lembrar esses tempos em que você e o Adauto vinham também nas férias...Você com seus belos desenhos de sempre, né?...
Posso fazer uma provável correção?...Acho que na foto da Balsa mais acima não é nos anos 50 e sim da mesma festa do filme em que o Jeremias foi festeiro pois no mastro da balsa tem um mirante com um menino Marinheiro que era o Reinaldo (filho do Sr. Jeremias) lembra-se?...Parece-me que foi a unica vez que a balsa teve um marinheiro no mirante, certo?...
Aproveito para enviar um grande abraço a você e a todos os "porangueiros" que como eu sentem muita falta daí.
Vou continuar lendo as notas e quando achar algo nos papéis de minha familia enviarei para você partilhar com todos.
Novamente meus saudosos Abraços.
Olá Enio!
ResponderExcluirVocê está gravado na nossa lembrança. Os comentários vindos da sua pessoa me deixa muito feliz. Continue a acompanhar o blog, pois na medida do possível vou escrever mais sobre nós e nosso mundo Iporanguense. Quando a sua observação sobre a balsa você tem toda razão, pois sem notar troquei a foto antiga por uma da coleção mais nova e vou corrigir a postagem.
Abrçs.